10 mitos sobre Howard Phillips Lovecraft

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Muitos mitos foram criados sobre a figura de Lovecraft, sendo que eles vem principalmente de erros de interpretação de suas ideias e filosofias, uma pratica que começou com August Derleth, seu correspondente. Adicionalmente, as falsas edições do Necronomicon, que estão avaliáveis para a população, espalharam muitos boatos, assim como as “informações” na internet sobre o Al-azif. Essas últimas fontes são possivelmente as piores ofensas, isso porque seu sucesso depende apenas da credibilidade de seus boatos.

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Confira, a seguir, alguns mitos sobre Lovecraft e porque não passam de boatos:

1º Mito: Lovecraft era um caseiro recluso que nunca saiu de Nova Inglaterra

Lovecraft é referenciado diversas vezes como uma pessoa reclusa, possivelmente porque acredita-se que passava mais tempo correspondendo pessoas do que fraternizando com elas pessoalmente. De qualquer forma, ao observarmos suas cartas fica claro que ele gastou uma quantidade considerável de tempo visitando amigos, tanto em sua casa quanto por todo o leste dos Estados Unidos. De fato, pode-se dizer que ele provavelmente só pode socializar com seus amigos e correspondentes, mais do que a maioria das pessoas pode, por que estava sempre desempregado!

Lovecraft viajava frequentemente e escreveu longamente sobre essas viagens. Esses artigos incluem “Vermont – Uma primeira impressão” (1927), “Observações sobre diversas partes da América” (1928), “Relatos de uma visita a Charleston” (1930) e “Uma descrição da cidade de Quebec, em Nova França, adicionada mais tarde aos domínios britânicos de sua majestade”. Com 75.000 palavras, Quebec foi o maior trabalho de Lovecraft (quase 150% do tamanho de “O caso de Charles Dexter Ward”), e ele o descreve como “136 páginas dessa cacografia maldita” (ou intricada). Suas viagens levaram ele tanto para o Sul quanto para De land, Florida e New Orleans, Louisiana; no oeste foi para Cleveland, Ohio; no norte para Quebec, Canada; e foi também para as ilhas de Nantucket por uma semana. Dificilmente um “Caseiro”, não é?

[Nota do tradutor: Como um fã de Lovecraft, não só por seus trabalhos mas também pela pessoa que ele era, eu fico muito feliz em saber que ele viajou e se alegrou ao fazer isso. A visão depressiva e reclusa que temos de Howard nos faz imaginar que sua vida não passou da mais pura agonia, no entanto, ao estudarmos um pouco, vemos que ele era um amigo incrível e visitava seus amigos sempre que podia. Não via tristeza em seu estilo de vida (inclusive ele fica muito animado ao admitir que gastava menos que $ 3,00 por semana em comida). Saber que ele foi uma pessoa feliz e de bem com a vida realmente é algo que aquece meu coração.]

2º Mito: Lovecraft era Homossexual

Lovecraft and Sonia Green photo | Lovecraftian stuff ...

Lovecraft teve pouco sucessos com mulheres e teve muitos amigos, o que levou pessoas a acreditar que ele era Homossexual. Contudo, deve ser lembrado que ele foi casado (brevemente) e sua esposa o descreveu como um “Um bom amante adequado” (Sonia H. Davis, “Memorias de Lovecraft: I, O colecionador de Arkhan”, No. 4, inverno de 1969). Alguns dos amigos e conhecidos de Lovecraft (sendo os mais notáveis: Robert H. Barlow, Samuel Loveman e HartCrane) eram homossexuais, mas Howard aparentemente nem mesmo percebeu isso. Lovecraft deixou seus pensamentos em relação aos homossexuais claros ao escrever para J. Vemon Shea em 14 de agosto de 1933:

   “De fato – Apesar de eu, obviamente, sempre ter em mente que a Pederastia era um costume nojento de muitas nações antigas- Eu nunca ouvi sobre Homossexualismo como um instinto até eu passar dos 30 . . . O que bate o seu recorde! É possível, acredito eu, que essa perversão ocorra mais frequentemente em alguns períodos do que outros – devido a obscuras causas biológicas ou psicológicas. As eras decadentes – quando o psicológico não está agitado – parecem favorecer. É claro – em tempos antigos a extensão da pratica da pederastia (como um costume que simplesmente aceitaram cegamente, sem qualquer inclinação especial) não pode ser tomada como qualquer medida do tamanho da perversão psicológica real.”

Adicionalmente, em uma carta a August Derleth datada de 16 de fevereiro de 1933, Lovecraft também escreve:

“Tão longe quanto os casos de homossexualismo vão, o argumento vital e primário contra isso é que naturalmente se trata de algo (fisicamente e involuntariamente – não meramente “moral” ou esteticamente) repugnante para uma maioria esmagadora da humanidade…”

Alguns podem argumentar que isso era apenas uma posição defensiva da parte de Lovecraft, mas ainda não existe evidência que aponte uma possível inclinação homossexual. Porém isso não quer dizer que seus impulsos heterossexuais eram especialmente fortes. Lovecraft, como muitos intelectuais, dedicou seus esforços e atenções a sua mente, mais do que ao físico. Ele simplesmente não tinha interesses sexuais tão fortes.

3º Mito: “Contribuições póstumas” de August Derleth

Após a morte de Lovecraft, August pegou alguns fragmentos de escritas de Howard (de seu caderno de anotações, por exemplo) e incorporou elas em histórias totalmente voltadas ao design de Derleth.

Contest History & Past Winners - Council for Wisconsin Writers

De acordo com a bibliografia de S.T. Joshi, o conto “The lurker ar the Threshold” de Derleth tem 50.000 palavras, e apenas 1200 palavras pertencem a Lovecraft – Isso é quase 2.4%. Nenhuma dessas “Colaborações Póstumas” deve ser considerada como autorizada por Lovecraft. Apesar disso, esses contos foram publicados como autoria de Lovecraft E Derleth, ou, pior ainda, apenas por Loveraft. Os livros de bolso de Carroll & Graf, “The Lurker at the Threshold” e “The Watchers out of time” incluem apenas o nome de Howard na capa, quando, na verdade, elas são na maior parte trabalho de August.

 

4º Mito: “Hastur, aquele que não deve nomeado” é uma invenção de Lovecraft

Hastur é mencionado por Lovecraft em apenas uma história, “O sussurro nas trevas”. Em uma das duas instâncias, Hastur é mencionado no mesmo momento como muitas criaturas, lugares e coisas:

“Vi-me diante de nomes e termos que eu sabia estarem associados a horrores indescritíveis – Yuggoth, Grande Cthulhu, Tsathoggua, Yog-sothoth, R’lyeh, Nyarlathotep, Azatoth, Hastur, Yian, Leng, o Lago de Hali, Bethmoora, o símbolo Amarelo, L’mur Kathulos, Bran e o Magnum Innominandun – e fui levado de volta no tempo através de éons inomináveis e dimensões inconcebíveis, até os mundos da entidade ancestral e extraterrena cuja existência o autor enlouquecido do Necronomicon havia insinuado apenas da maneira mais vaga possível”

Lovecraft pegou Hastur emprestado de Robert W. Chamber (“The yellow sign” e “The repairer of Reputations“), que, também, pegou emprestado de Ambrose Bierce.

Livro - O Rei de Amarelo - Americanas.com

Em “An Inhabitant of Carcosa” Pierce descreve Hastur como o deus dos pastores. Chambers depois usou o nome como uma cidade. Lovecraft nunca deixou claro ter a intenção do que Hastur seria – apenas coloca seu nome fora de contexto para evocar uma atmosfera.
Na  lista acima de “Um sussurro nas trevas”, note que a última coisa a ser mencionada é “The magnum innominandum”, que em Latim significa “O grande que não deve ser nomeado”. Como de costume, Lovecraft não deixa claro o que é isso, mas Derleth aparentemente combinou essa referência com o Hastur para criar “Hastur, aquele não deve ser nomeado”.

 5º Mito: Uma fala do Lovecraft sobre magia negra

Em sua introdução ao livro “The Dunwich Horror and Others” da editora Arkham House, August Derleth faz o seguinte comentário:

 “O padrão das histórias dos Mythos é algo básico na história da humanidade, representando o duelo entre o Bem e o mal; nesse, que é similar aos mitos cristãos, especialmente em relação a expulsão de Satan do Éden e o poder eterno do mal. “Todas as minhas histórias, desconectadas como elas são”, escreve Lovecraft, “são baseadas na história ou lenda fundamental de que esse mundo era habitado a algum tempo por membros de outra raça que, ao praticar magia negra, perderam seu apoio e foram expulsas, agora vivem no exterior sempre prontos a tomar conta dessa terra novamente.”

Na verdade, Lovecraft nunca disse (ou escreveu) isso, essa fala vem de Harold Farnese, um breve correspondente de Howard. Depois da morte de Lovecraft, Derleth escreveu a Farnese perguntando se este poderia pegar as cartas de Lovecraft emprestadas. Farnese permitiu generosamente, e enviou as cartas para Derleth. Farnese escreveu para Derleth nas correspondências e muitas vezes “citava falas” de Lovecraft – Essas falas parecem ser, na melhor das hipóteses, paráfrases. Em uma delas, Farnese escreve:

 “Ao cumprimentar HPL por seu trabalho, ele respondeu: “Você vai, naturalmente, perceber que todas as minhas histórias, soltas como elas podem ser, baseiam-se em uma lenda ou mito fundamental: que este mundo foi habitado em algum tempo por outra raça, que ao praticar magia negra, perderam a sua posição e foram expulsos, mas vivem do lado de fora, sempre prontos a tomar posse desta terra novamente.”

Derleth pegou essa “fala” como verdadeira e usou elas em diversas ocasiões, mas as investigações das cartas de Lovecraft não encontraram essa “fala”. Em diversas outras cartas para Derleth, Farnese cita as cartas que enviou a Derleth, mas a comparação com as próprias cartas revela que Farnese não estava citando, mas meramente recordando. Farnese em alguns pontos se referiu como escritor, para a Weird Tales, pelo nome de “Bellknap Jones”- uma referência Obvia a Frank Belknap Long.

6º Mito: O símbolo ancião de Lovecraft

Lovecraft não dá nenhuma descrição física do símbolo ancião em nenhum momento de suas histórias. Ele menciona em escassas quatro vezes, e essas menções parecem implicar que é um gesto com a mão. Lovecraft termina uma letra para Clark Ashton Smith, datada de 7 de 1930, com o seguinte comentário:

 “Estou agradecendo você novamente pelo nome de Tshathoggua para a remessa recente, & espero ver itens que venham da sua pena (caneta) durante um bom tempo, eu acrescento o sinal ancião & o selo de N’gah, se entregando ao Círculo sombrio de Y’hu.”

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Seguindo disso Lovecraft assina seu nome (“Ech’h-Pi-EL”) e desenha duas figuras peculiares. O último, o selo de N’gah, parece algo como um Besouro de Veado, com 6 pernas e três chifres. O primeiro, o símbolo ancião, parece como o ramo de um pinheiro. O mito de que o símbolo ancião é um pentagrama com um olho flamejante no centro veio provavelmente da descrição de August Derleth em seu conto “The lurker at the Threshold

7º Mito: o Necronomicon é real

Necronomicon Book Cover | BespokeBugFacilmente o mito mais espalhado em torno da figura de Lovecraft, provavelmente precisaríamos de um livro inteiro só para documentar todos os boatos que cercam o tomo fictício. Para mais informações sobre essa lenda, dê uma olhada em Verdades e (principalmente) Mentiras sobre o terrível Necronomicon. Os próximos mitos existem justamente por causa das versões falsas do Al-azif.

8º Mito: O pai de Lovecraft era Maçon

Para essa lenda nós temos a introdução de Colin Wilson para o Necronomicon, da edição de George Hay:

“Dr. Stanislaus Hinterstoisser… Escreveu a mim, via Carl (Tausk), dizendo que ele não poderia entrar em detalhes sobre sua fonte de informações do pai de Lovecraft, mas ele podia afirmar categoricamente que não apenas o Winfield Lovecraft era um maçom egípcio, como ele possuiu pelo menos dois livros mágicos, o famoso “Picatrix of Maslama ibn Ahma al-Magritit“, também conhecido como “pseudo-Magriti”, e “Godziher’s book of the Essence of the Soul“”.

Wilson chega a afirmar que o Necronomicon, que Lovecraft diz em “O horror de Dunwich” ter pelo menos 751 páginas, é apenas uma porção do livro “Book of the Essence of the soul”! Portanto, ele está basicamente dizendo que Winfield Lovecraft possuía um “Necronomicon” completo. Apesar de toda essa bobagem nosense, na edição de 1984 de St. John’s Eve de Crypt of Cthulhu, Colin Wilson admitiu que “Era uma paródia TÃO óbvia”… Como se fosse necessário apontar isso…

No entanto não há nenhuma evidência que indique que o pai de Lovecraft era um maçom. Seu avô, Whipple Van Buren Phillips, era muito ativo na maçonaria. Whipple Philips possuiu muitos territórios em volta da cidade de Greene, Rhode Island, e fundou a Ionic Lodge No. 28 ali em 1870. O salão de apresentações, que foi usado e continua sendo utilizado pelo maçons desde 1886, possui um retrato de Phillips. Apesar disso, ainda não há razão para acreditar que Maçons, egípcios ou outros, tinham acesso à cópias raras de um livro fictício!

9º Mito: As inspirações de Lovecraft para suas criações vieram da mitologia Suméria

Esse erro comum veio da edição falsa do Necronomicon editada por “Simon”. O conteúdo desse livro é supostamente baseada em mitologia Suméria e Babilônica, e diz que Lovecraft bebeu de fontes parecidas quando ele criou sua pseudo-mitologia. O livro faz comparações entre as criaturas de Lovecraft e figuras de mitologia Suméria

Lovecraft            | Mitologia Suméria

Cthulhu               |Ctha-lu, Kutulu

Azathoth             |Azag-thoth

Shub-Niggurath |Shub Ishniggarab

Essa comparações são especialmente tênues, isso porque nenhuma dessas “figuras” aparece na mitologia Suméria ou babilônica! Referindo-se a qualquer bom texto nas duas mitologias que demonstre isso. Adicionalmente, sugerir que Lovecraft teve que copiar esses nomes de uma mitologia já existente vai justamente contra seu princípio de criar apenas nomes não humanos para suas criaturas e diminui a qualidade de sua imaginação.

10º Mito: Lovecraft (ou sua esposa, Sonia) estavam associados a Aleister Crowley

Novamente, nós temos que agradecer esse mito a edição de “Simon” do Necronomicon. O livro implica algum tipo de conexão vaga entre Lovecraft e Crowley:

 “Que um escritor recluso de histórias curtas que vivia em um bairro calmo na Nova Inglaterra e o maníaco e infame mestre mágico que chamou o mundo de sua casa, deveriam ter se encontrado de alguma forma nos resíduos arenosos de alguma civilização esquecida parece incrível.

The LOCH NESS MONSTER, ALEISTER CROWLEY and the Satanic ...

Que ambos se tornaram profetas e precursores de uma nova era da história do homem é igualmente, se não mais, inacreditável. No entanto, com H.P. Lovecraft e Aleister Crowley, o inacreditável era um lugar comum da vida. Estes dois homens, ambos aclamados como gênios por seus seguidores e admiradores, e que nunca se encontraram realmente, esticaram suas pernas através do mundo, e foi nas botas de 7 léguas de suas mentes que eles se encontraram em um solo comum. . .. Suméria.”

Fora aquele mito do “recluso” surgindo novamente, este é apenas o tipo de implicação vaga que não leva a nada mas faz os leitores pensarem algo. Adicionalmente, o Necronomicon Anti-FAQ de Colin Low não dizia que a conexão era entre Lovecraft e Crowley. Dessa vez… Era a esposa de Lovecraft, Sonia Greene:

“Crowley estava em Nova york em 1918. Como sempre, ele estava tentando estabelecer sua reputação literária, e ele estava contribuindo com o “The international” e o “Vanity Fair“. Sonia Greene era uma Judia imigrante energética com ambições literárias, e ela tinha se juntando ao jantar do clube de leitura chamado “Walker’s Sunrise Club” (?!); E foi aqui que ela encontrou Crowley pela primeira vez, que foi convidado para falar sobre poesia moderna…

Crowley não perdeu tempo no que diz respeito as mulheres, eles passaram a se encontrar irregularmente durante alguns meses.”

The Mysterious Love of Sonia Greene for H.P. Lovecraft ...Novamente, tais aclamações são completamente infundadas. Low ainda diz que Lovecraft ouviu falar do Necronomicon primeiramente por Greene, que, por sua vez, ouviu isso de Crowley. Isso é uma incrível coincidência, pois Lovecraft menciona o Necronomicon pela primeira vez em “The Hound“, que ele escreveu na metade de 1921 – Apenas três meses depois de conhecer Greene. De qualquer forma, Lovecraft menciona Abdul Alhazred, o autor do necronomicon, pela primeira vez em “The Nameless City” (que ele escreveu em janeiro de 1921), seis meses antes de conhecer Greene. Ainda assim, tudo isso não é mais discutido desde que Colin Low admitiu abertamente que seu “Necronomicon Anti-FAQ“, como o livro que discute, é uma farsa.

Espero que o texto tenha esclarecido algumas dúvidas. E não fique triste se você acreditava em alguns desses mitos antes de ler o texto, eu mesmo considerava o primeiro como uma verdade absoluta, mas o mundo sempre está ai para provarmos que estamos errados. Ah, deem uma passada no site de onde esse texto veio, tem muita coisa interessante sobre a vida do Lovecraft e sua personalidade, os fãs com certeza vão adorar. Ate mais e… Ah, com o tempo eu penso em algo pra escrever no final.

 Ess texto é meramente uma tradução do artigo H.P. Lovecraft Misconceptions.

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