A informática no Brasil da ditadura

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Computadores antigos… Vocês sabem, não é? Tijolos enormes que faziam menos da metade do que nossos celulares fazem hoje em dia. Mas e se formos mais fundo ainda? Quando um computador ocupava um andar inteiro do prédio, era alimentados por 70 mil lâmpadas internas e pesava, em média, 27 toneladas?

alan turing imitation game | Tumblr
É tudo analógico nessa porra

Estamos nos anos 50, Alan Turing já tinha desenvolvido o Jogo da imitação, O instituto de Tecnologia de Massachusetts tinha acabado de criar o primeiro computador interativo de tempo real, A J. Lyons fazia história ao usar o primeiro programa voltado aos negócios em um computador elétrico e o Brasil recebia, de braços abertos, o seu primeiro computador: uma máquina composta principalmente de válvulas, que tinha como objetivo estipular o consumo de água na cidade.

O primeiro grande salto na informática brasileira começou em 1958 e se estendeu até 1975. Esse avanço se deu, pelo menos nos anos iniciais, pela grande importação de tecnologia de países de capitalismo avançado – como a famosa terra do tio Sam.
Os mainframes, computadores caracterizados por serem potentes e igualmente espaçosos, eram responsáveis pelo processamento eletrônico de dados, era possível encontra-los em universidades e grandes empresas, assim como em órgãos governamentais e agências de serviço. Não existiam fabricantes brasileiros, mas lentamente começamos a desenvolver uma competência tecnológica nacional, a partir do trabalho de algumas universidades, como a Universidade de São Paulo, a Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro e a Universidade Estadual de Campinas.

IBM 305 RAMAC System - CHM Revolution
Ramac 305, vai brincando!

Em 1959 a Anderson Clayton introduziu o primeiro computador da IBM no país, um Ramac 305, com mil válvulas e disco de 150 KB, complexo que ocupava todo um andar da empresa. A Universidade de São Paulo (USP) não tardou em adquirir um computador, o IBM-1620. Com a crescente difusão dos computadores, os principais fabricantes mundiais se estabeleceram no país, coisa que, mais tarde, incomodaria o governo e seus planos de desenvolvimento.

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Em 1964, o Brasil sofria um duro golpe: o não tão querido presidente João Goulart foi deposto e os Militares tomam o poder. Logo criando artigos que lhes davam o poder de alterar a constituição, anular mandatos legislativos, interromper direitos políticos por 10 anos e demitir, colocar em disponibilidade ou aposentar compulsoriamente qualquer pessoa que fosse contra a segurança do país, o regime democrático e a probidade da administração pública, além de determinar eleições indiretas para a presidência da República. A liberdade de expressão e de organização era quase inexistente. Partidos políticos, sindicatos, agremiações estudantis e outras organizações representativas da sociedade foram suprimidas ou sofreram interferência do governo. Os meios de comunicação e as manifestações artísticas foram reprimidos pela censura.

O Contemporâneo: Ditadura no Brasil: as voltas do retrocesso

A década de 1960 iniciou também, um período de grandes transformações na economia do Brasil, de modernização da indústria e dos serviços, de concentração de renda, de abertura ao capital estrangeiro e do endividamento externo. Em 1967, na presidência de Artur da Costa e Silva, o governo lança o Plano Estratégico de Desenvolvimento, primeira tentativa oficial de estabelecimento de uma política para o desenvolvimento de tecnologia nacional e fabricação de equipamentos eletrônicos, computadores entre eles, financiando os principais centros acadêmicos do pais para a implementação dessa política. Em 1969, a Junta Militar escolhe o novo presidente: o general Emílio Garrastazu Médici. Seu governo é considerado o mais duro e repressivo do período, conhecido como ” anos de chumbo “. A repressão à luta armada cresce e uma severa política de censura é colocada em execução. Jornais, revistas, livros, peças de teatro, filmes, músicas e outras formas de expressão artística são censuradas. Muitos professores, políticos, músicos, artistas e escritores são investigados, presos, torturados ou exilados do país.

No final de 1971, levantamento realizado pelo Ministério do Planejamento apontou a existência de cerca de 600 computadores no país, sendo 75% da IBM, 20% da Burroughs e 5% de outros. O Brasil representava entre 0.5% e 1% do mercado mundial
A produção nacional até esse momento se resumia a alguns poucos modelos de computadores de médio porte, em uso na Marinha, e alguns periféricos para os equipamentos de grande porte.
O interesse de vários segmentos da sociedade brasileira, notadamente os militares e os meios científicos, buscando atingir melhor independência tecnológica para a informática brasileira, levou à criação, em 1972, da Capre (Comissão de Coordenação das Atividades de Processamento Eletrônico), com o objetivo de propor uma política governamental de desenvolvimento do setor.
Na área econômica o país crescia rapidamente. Este período que vai de 1969 a 1973 ficou conhecido com a época do Milagre Econômico. O PIB brasileiro crescia a uma taxa de quase 12% ao ano, enquanto a inflação beirava os 18%. Com investimentos internos e empréstimos do exterior, o país avançou e estruturou uma base de infraestrutura. Todos estes investimentos geraram milhões de empregos pelo país. Algumas obras, consideradas faraônicas, foram executadas, como a Rodovia Transamazônica e a Ponte Rio-Niterói.
Porém, todo esse crescimento teve um custo altíssimo e a conta deveria ser paga no futuro. Os empréstimos estrangeiros geraram uma dívida externa elevada para os padrões econômicos do Brasil.
Em 1974 assume a presidência o general Ernesto Geisel que começa um lento processo de transição rumo à democracia. Seu governo coincide com o fim do milagre econômico e com a insatisfação popular em altas taxas. A crise do petróleo e a recessão mundial interferem na economia brasileira, no momento em que os créditos e empréstimos internacionais diminuem. Enquanto Geisel aumentava a liberdade política, seu governo fechava o mercado internacional.
O predomínio da IBM e da Sperry na adoção dos computadores incomodava os líderes do governo que viam cada vez mais distante o atingimento de seus objetivos.

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Computador da Sperry

Mas isso não ocorria somente no Brasil: países como Japão, Inglaterra, Alemanha e até mesmo a França, que via reduzida sua presença no mercado nacional e internacional após o lançamento da família S/360 da IBM, partiram para políticas protecionistas na sua indústria.
O cenário, de pouco avanço da iniciativa nacional em pouco mais de cinco anos de investimentos, gerou grande preocupação na cúpula do governo que buscou acelerar o desenvolvimento da indústria nacional através da criação da Comissão de Coordenação das Atividades de Processamento Eletrônico, CAPRE, via decreto assinado pelo ministro do Planejamento João Paulo dos Reis Veloso, em 5 de abril de 1972. Os primeiros minicomputadores nacionais, inicialmente utilizando tecnologia estrangeira, passaram a ser fabricados por cinco empresas autorizadas pelo governo federal.
Com a posse do novo presidente Ernesto Geisel em 1974, o governo decide reforçar a política de informática e lança a nova versão do Plano Nacional de Desenvolvimento (PND), dando maior ênfase na fabricação de componentes eletrônicos, circuitos integrados e centrais digitais de telecomunicações.
Já nessa época, o parque de computadores instalados no pais, de acordo com relatórios da CAPRE, apresentava cerca de 2700 maquinas entre minis, médio e grande porte, um crescimento de aproximadamente 50% em relação ao ano anterior, sendo que mais de 98% era fruto de importação.
A Burroughs liderava no segmento de minis e a IBM nos de médio e grande porte. A Honeywell-Bull vinha em terceiro lugar seguida de Olivetti, Philips, DEC, HP NCR e outras de pequena representatividade e que totalizavam cerca de 35 empresas estrangeiras no setor eletroeletrônico. Diante de tal cenário, em que os investimentos e esforços do governo não pareciam alterar o quadro de dependência das importações, o governo decidiu colocar restrições aos processos de importação, decretando um conjunto de regras que restringiam e dificultavam a importação de peças eletrônicas, computadores e periféricos, a partir de dezembro de 1975.

The FJP — IBM PORTABLE COMPUTER (1975) IBM introduced the...

Os desdobramentos da política de restrição as importações juntamente com o incentivo a indústria nacional, acabou por desenhar um cenário de ‘Reserva de Mercado‘. Onde o mercado seria segmentando por áreas, algumas a serem supridas pela indústria nacional, essencialmente para minicomputadores e áreas que continuariam abertas as importações, e outras a serem supridas pelas multinacionais radicadas no pais. Dentro dessa segmentação, caberia a COBRA, a empresa estatal pioneira na produção de computadores no Brasil, suprir o mercado com computadores de pequeno porte, além de alguns periféricos para os demais fornecedores. A concorrência tornou-se mais acirrada com a competitividade da Cobra e com a expectativa de crescimento do mercado brasileiro, atraindo com isso investimentos dos grandes players mundiais.
Em junho de 1976 a IBM anuncia a fabricação, no Brasil, do seu modelo mundial de minicomputador, o Sistema /32. No que essa decisão e outros fatores ao longo dos anos irão resultar, você confere no próximo post.

Fontes:
[Artigo]História da Informática no Brasil nos Anos 60, 70, 80 e 90
[Artigo]Computadores no Brasil e Mainframes
[Documentário]Descubra como a pirataria e o jeitinho brasileiro explicam a cultura de games no Brasil
[Artigo]Ditadura Militar no Brasil – 1964 – 1985

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